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Entre bananas e esculturas invisíveis:  arte e/ou comércio, ambas ou nenhuma delas? 





A criatividade humana parece não encontrar limites, especialmente no campo das artes. E quando esta se une a um bom projeto de marketing apto a transferir todas as atenções do artista para aquele que adquire a obra, estamos diante de um plano rentável de promoção pessoal que o dinheiro pode comprar. 


A banana presa com fita adesiva é a obra de arte do momento, não pelas suas qualidades intrínsecas, mas porque está à venda e pode alcançar no leilão o valor de até R$ 5 milhões [1]. Trata-se de um valor expressivo que em nada se compatibiliza com o ditado popular “a preço de banana”.  

 

Contudo, continua sendo uma banana, que o direito classifica como um bem fungível e perecível. Ou seja, pode ser substituído por outro bem da mesma espécie, quantidade e qualidade. Além disso, é um bem que o tempo lhe consumirá a substância, pois apodrecerá, isso se não for consumida antes. 

 

Neste aspecto, todas as características que fazem uma obra de arte ser única e exclusiva não estão presentes na “banana presa com fita”, pois é uma junção desconjuntada de tudo aquilo que se possa imaginar como trivial e acessível a todos. Menos, é claro, o local onde a performance foi realizada, pois certamente seria considerado insano aquele que mantivesse em sua casa uma banana presa com fita adesiva na parede. Mas, os museus parecem ter esse poder de Midas, transformando em arte tudo o que lhe é tocado.    

 

As características peculiares desta “obra de arte” despertam as atenções do público, mais por ser inusitada e contrariar as expectativas e os conceitos prévios que o senso comum possui sobre o que é arte. Muitos já buscaram diferenciar a “arte” da “não arte”. Leon Tolstói jogou-se nessa empreitada repleta de subjetivismos em que o gosto individual é algo quase inescapável, e que seduz todos que caminham pelo campo das artes. 

 

Nesta tentativa de definir a arte Tolstói, então, afirma:   

 

[...] arte é a atividade humana que consiste em um homem conscientemente transmitir a outros, por certos sinais exteriores, os sentimentos que ele vivenciou, e esses outros serem contagiados por esses sentimentos, experimentando-os também. [...] é [...] um meio de intercâmbio humano, necessário para a vida e para o movimento em direção ao bem de cada homem e da humanidade, unindo-os em um mesmo sentimento [2].  

 

Mas, como saber que nessa transmissão consciente os sentimentos do artista são verdadeiros e se a mensagem alcançou os espectadores? Como saber se estão experimentando os mesmos sentimentos? Trilhar esse caminho é cair em infindáveis questionamentos que estão no domínio da especulação. O importante, talvez, não seja definir o que é arte, mas deixá-la fluir e provocar nos espectadores inquietações sobre as quais não conseguem ficar indiferentes.  

 

No caso da banana presa com fita adesiva, saber se ela é arte ou não arte parece ser irrelevante, pois ela é secundária em relação ao valor que alguém está se propondo a pagar, repetindo performances como a da escultura invisível, trazendo à tona, novamente, o velho golpe retratado no conto “A roupa nova do Rei”, de Hans Christian Andersen [3]. 

 

Performances artísticas como estas estão se mostrando exitosas para cativar o interesse de pessoas com grande riqueza e dispostas a gastar quantias elevadas, deixando no ar a dúvida se elas padecem da ingenuidade do Rei que adquiriu a roupa invisível e prostrou-se nu perante os seus súditos, ou se, ao contrário, estão se promovendo pessoalmente, na tentativa de transmitir uma imagem de superioridade quase mítica, pois conseguiriam enxergar a roupa que apenas as pessoas inteligentes conseguem ver, como no conto de Andersen? 

 

A resposta para essa indagação será dada quando alguém viralizar uma postagem nas redes sociais gritando: “- coitado do Rei ... Está nu!” e a multidão viralizar em coro “O Rei está nu! O Rei está nu!”.  


Allan Carlos Moreira Magalhães, Doutor em Direito. Professor da Universidade do Estado do Amazonas. Articulista do Instituto Brasileiro de Direitos Culturais (IBDCult). É Autor do livro “Patrimônio cultural, democracia e federalismo” e coautor do livro “É disso que o povo gosta: o patrimônio cultural no cotidiano da comunidade”   



 

Notas:  [1] FALA BRASIL. Notícia. Banana com fita adesiva custa R$ 5 milhões. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=WX9bJZUuHpE Acesso em: 10 nov. 2024. 

 

[2] TOLSTÓI, Leon. O que é arte: a polêmica visão do autor de Guerra e Paz. Trad. Bete Torri. 2ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2016, p. 60. 

 

[3] MAGALHAES, Allan Carlos Moreira. A escultura invisível e o velho golpe da roupa do Rei. Coluna Exordial. IBDCult. Disponível em: https://www.ibdcult.org/post/a-escultura-invis%C3%ADvel-e-o-velho-golpe-da-roupa-do-rei Acesso em: 10 nov. 2024. 

 


 

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